2008-03-28

A casa do escritor no Minho




Em Santa Cruz do Douro, concelho de Baião, entre socalcos, vinhas generosas, (cujo suco é mundialmente conhecido), pinheiros altos e casas modernas de gosto duvidoso, deparamos com uma casa rural em granito. Chegamos a Tormes, lugar de referência da geografia queirosiana, hoje uma Casa-Museu e sede da Fundação Eça de Queirós, cujo objectivo é preservar e divulgar o legado cultural e literário do escritor. Quando Eça aqui chegou, pela primeira vez, certamente ficou deslumbrado com a beleza natural desta terra rude, laboriosamente bordada por mãos suadas de gente enérgica. Todavia não apreciou a casa, como podemos ler numa carta que escreveu a sua mulher: “... a casa é feia, muito feia; e à fachada mesmo pode-se aplicar, sem injustiça, a designação de hedionda. Tem um arco enorme; e, por debaixo dele, duas escadas paralelas, que são de um mau gosto incomparável.”Eça acabava de chegar de Paris, a cidade supercivilizada, e foi essa circunstância que não lhe deve ter permitido apreciar a construção, tão característica das casas rurais das gentes abastadas do Alto Douro. O estado de degradação da casa também muito terá contribuído para isso.O seu interior deveria parecer-se muito com a descrição que dele faz Zé Fernandes, em A Cidade e as Serras. “As salas eram enormes, duma sonoridade de casa capitular, com os grossos muros enegrecidos pelo tempo e pelo abandono, e regeladas, desoladamente nuas (...) Sob os nossos passos, aqui e além, uma tábua podre rangia e cedia.”
Foi esta casa, herdada em 1892 pela esposa do escritor, Emília de Castro, e todo o cenário envolvente que serviram de inspiração ao romance A Cidade e as Serras. Eça pernoitou nela por duas ou três ocasiões e isso bastou para que ficasse seduzido. A falta de conforto era compensada pelos deliciosos pratos confeccionados pela mulher do caseiro.Graças aos esforços de um dos netos do escritor e da mulher, é hoje possível admirar a cadeira em couro de espaldar alto, conhecida por “cadeira de Jacinto” , a mesa do famoso almoço de favas daquela personagem, os móveis da sua casa em Neully, onde faleceu, a escrivaninha de pé alto onde, por hábito, redigia os seus escritos, bibelôs, quadros, gravuras, objectos de uso pessoal, manuscritos, diplomas, etc.

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